Foto: Arquivopessoal |
A advogada piauiense Josselene Muniz, 60 anos, fez um relato marcante à Revista Marie Claire,nesta terça-feira (28). Ela, que também é professora, revelou à publicação que o seu agora ex-marido tirava fotos dela nua e publicava para amigos virtuais em grupos no aplicativo Whastapp.
As imagens, segundo Josselene, eram feitas enquanto ela
dormia e publicadas sem sua autorização. A advogada descobriu as publicações em
maio deste ano. "A sensação foi horrível. Fiquei com falta de ar, de
passar mal mesmo. Fiquei tomando tranquilizante. Tinha 35 anos de casamento e
nunca autorizei tirar uma foto minha", contou ao Cidadeverde.com.
A advogada procurou à Polícia Civil e fez um boletim de
ocorrência. Após a denúncia, ela obteve na Justiça uma medida protetiva para
que o ex não se aproximasse dela. "A delegada me orientou trocar as
fechaduras do apartamento. Mas ele nunca me ameaçou, nem me procurou",
acrescenta Josselene.
Diante da repercussão do depoimento, a advogada espera ajudar
outras mulheres vítimas do mesmo crime e defende que o ex-marido seja
responsabilizado pelo que fez.
O Cidadeverde.com entrou em contato com ex-marido de
Josselene, mas não obteve resposta. O espaço está aberto para esclarecimentos.
A delegada Bruna Verena, coordenadora do Departamento de
Proteção à Mulher, explica que é crime divulgar/compartilhar foto ou vídeos de
cenas de sexo, nudez ou pornografia. A reclusão para o autor varia de 1 a 5
anos, se o fato não constitui crime mais grave.
A pena é aumentada de 1/3 a 2/3 se o crime é praticado por
agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com
o fim de vingança ou humilhação.
Veja o relato completo da advogada
"Conheci Paulo (nome fictício) na faculdade. Estudava
letras na Universidade Federal do Piauí e ele, história. Nos casamos em 1985,
quando eu tinha 25 anos. Ele nunca foi muito romântico nem carinhoso, como eu
gostaria. Mas era um homem bom, digno, íntegro. Como sempre fui extrovertida e
comunicativa, achava até ele pacato, tímido e discreto demais para o meu gosto.
Mas era só na rua. Sempre moralista, em casa era Paulo quem ditava as regras.
Com os filhos também sempre foi conservador e metódico. Ciumento, vivia me
diminuindo. Dizia que eu era uma ‘Maria ninguém’, um nada.
Há cerca de oito anos, comecei a reparar que ele não saia das
salas de bate-papo na internet. Mas, de uns três anos pra cá, a coisa só
piorou. Paulo passava horas e horas trancado no banheiro ou no quarto e, quando
o questionava, dizia que estava fazendo pesquisas para o trabalho. E ainda me
atacava, falava que eu estava criando coisas na minha cabeça.
Até que, em maio deste ano, há quase dois meses em
quarentena, ele estava no celular dentro do carro, na garagem do nosso
condomínio, e me aproximei sem ser notada. Paulo tomou um baita susto quando me
viu e tentou disfarçar. Desligou imediatamente o celular, mas eu já tinha visto
tudo: meu marido estava enviando fotos minhas sem roupa por WhatsApp. Desde
menina, tenho o costume de dormir sem calcinha. Os mais antigos, aqui da nossa
região, no Piauí, diziam que era bom para deixar a vagina respirar. E eram justamente
essas imagens que ele compartilhava, sabe-se lá com quem.
Não consigo expressar em palavras o que senti. Talvez porque,
naquele momento, não consegui distinguir o que se passava dentro de mim.
Decepção, raiva, nojo... Além de uma enorme dor no peito e muito, muito medo.
Quem era aquele homem com quem vivia havia 35 anos? O que se passava pela
cabeça dele, de que mais era capaz? A sensação era de ter levado uma facada no
peito, bem no meio do coração.
Desesperada e sem parar de chorar, subi para o meu
apartamento e contei tudo para os nossos filhos [dois homens e uma mulher]. Os
três ficaram em choque. Poucos minutos depois, Paulo entrou em casa de cabeça
baixa. Na frente de todos, me pedia perdão repetidamente e implorava por uma
nova chance. Sem nem conseguir olhar para os filhos, jurava que isso nunca mais
aconteceria. Em meio àquela loucura, confessou que ele e outro homem trocavam
fotos de suas respectivas mulheres despidas, sempre clicadas sem consentimento,
quando estávamos dormindo. Claramente, acreditava ser meu dono, e dizia se
tratar apenas de um fetiche, como ele mesmo dizia, nada demais.
No dia seguinte, juntei suas roupas, com a ajuda de nossa
filha, e pedi que fosse embora de casa. E assim ele fez, cabisbaixo e sem dizer
uma palavra.
Três dias depois, decidi denunciá-lo. Me orientaram a fazer
primeiro uma queixa virtual e depois um atendimento presencial na delegacia
para crimes digitais. A medida protetiva, que o proíbe de se aproximar a menos
de 300 metros de mim, saiu oito dias depois, em 30 de junho - e foi assinada
pelo juiz da 5ª Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher.
Soube que Paulo foi morar na casa de uma irmã, mas nunca mais
tivemos contato. Recentemente, ele ainda tentou se aproximar da minha filha,
mas nunca foi atendido. Ela está arrasada, envergonhada e não quer ver o pai
nem pintado de ouro.
Quando conto, as pessoas custam a acreditar. Um cara tão
sisudo, moralista e cheio de normas em casa fazer uma coisa dessas com a
própria mulher é realmente bizarro. Sei que minhas fotos nuas já podem ter
rodado o mundo, e só quero que ele pague pelo que fez. Porque a dor que senti
nunca mais terei como apagar”.
*Nome fictício
Izabella Pimentel/Cidadeverde.com
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